Saltar para: Post [1], Comentar [2], Pesquisa e Arquivos [3]

A Outra Menina Bennet

A Outra Menina Bennet

05
Abr21

“A Missa do Ateu”, Honoré de Balzac

Sofia

Meu caro amigo, se não acredito em Deus, acredito ainda menos no homem.

The Atheist's Mass by Honore de Balzac

A Missa do Ateu é um conto de Balzac publicado em 1836 e faz farte da volumosa coleção do autor ­– A Comédia Humana.

 

Este conto centra fundamentalmente duas personagens – o médico Bianchon e o seu mestre Desplein, que são também encontrados em outros momentos d’A Comédia Humana. O conto inicia ilustrando Desplein como um ateu convicto que acredita apenas no conhecimento científico. Todavia, isso não impede que Bianchon o surpreenda certa vez a assistir a uma missa. O conto compreende a explicação de Desplein para este seu hábito de, em certas datas, assistir à missa. Há tempos, Desplein havia conhecido Bourgeat, alguém que o ajudou e que muito considerava. Bourgeat era  um fervoroso crente e, o hábito do protagonista ateu em assistir a missas revela-se como fruto da sua vontade em mandar dizer missas por alma do seu querido e falecido amigo.

Três aspetos que destacaria. Por um lado, o evidente paradoxo que é um ateu não somente assistir a missas, mas inclusive mandar dizê-las. Em seguida, o facto da sua ideologia não se traduzir em intolerância. Por fim, o cariz do seu afeto pelo falecido amigo que justifica o seu contraditório hábito.

Penso que os três aspetos estão íntima e complexamente relacionados. É óbvio que a única motivação ao comportamento singular deste protagonista ateu é a sua gratidão, afeto e reconhecimento por alguém para si muito importante. É igualmente claro que este laço é dotado de uma natureza muito semelhante (senão mesmo) religiosa. Por sua vez, a religiosidade e profundidade deste laço impede a intolerância ideológica que o poderia caracterizar e que é notória em outras posturas suas. Estas idiossincrasias são indicativas da complexidade humana e da profundidade singular das relações sociais e são captadas neste conto de um modo muito vívido.

Causa estranheza, ao lermos o conto e percebermos a convicção inabalável do protagonista, descobrirmos o seu hábito. Porém, quando descobrimos a sua motivação, tudo resulta claro e não há espaço para questionar.

Quando acabei a leitura e refleti sobre o caracter paradoxal da história, percebi que hoje aquilo ali expresso é recorrente. Ninguém questiona o acto de alguém que não seja em assistir pontualmente a uma missa por alma de alguém de quem gosta, por exemplo. Não se pergunta se aquelas pessoas estão ali porque não seguem realmente a sua ideologia, se porque se importavam muito com a pessoa de quem fazem o luto, ou simplesmente por uma questão social. É um hábito tão natural e recorrente que me surpreende que tenha ficado tão cativada com o conto e com aquilo representado. Certamente um sinal da sua prodigiosidade e do mérito do seu autor.

Conhecem A Comédia Humana? Qual o vosso conto/episódio preferido?

 

Comentar:

Mais

Se preenchido, o e-mail é usado apenas para notificação de respostas.

Este blog tem comentários moderados.

Mais sobre a Sofia

Estudante de Letras. Romântica Incurável. Perdida algures num sonho. Apaixonada por livros, chá, contos de fadas, tragédias e chuva. Entre Flores & Estrelas.

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2021
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2020
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2019
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2018
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2017
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub