“O Monge”, Matthew Lewis
“O Homem nasceu para a sociedade. Independentemente do quão pouco ele esteja ligado ao mundo, ele nunca o pode esquecer completamente, ou aceitar ser por ele completamente esquecido.”
É com muito entusiasmo que escrevo este post! Lembram-se de há duas semanas ter escrito aqui na review de O Italiano de Ann Radcliffe que ia ler este The Monk, O Monge na edição pertuguesa? Ann Radcliffe tinha escrito aquele livro como resposta a este e, na review em questão eu referi que se gostasse desta obra viria aqui falar dela, ignorando o facto de que tenho feito imensas reviews de romances góticos. A questão é que eu simplesmente adorei esta obra! Então cá estou eu.
O Monge segue Ambrosio, um monge exemplar. Foi abandonado num mosteiro enquanto criança e criado dentro daquelas paredes. Acabou por proferir os votos e ingressar na vida eclesiástica onde se tornou um autêntico modelo, nunca abandonando as paredes e conforto do mosteiro. Admirado por toda a população devido à sua santidade, virtude e severidade, rapidamente é considerado como divino, um anjo na terra. O problema começa quando um dos seus mais queridos amigos se revela ser na verdade uma mulher – Matilda. Matilda estava ali disfarçada de homem com o único propósito de estar perto de Ambrosio, estava apaixonada por ele. Já podem calcular no que dá esta situação. Ambrosio não é, afinal, o modelo e protótipo de virtue e devoção que todos acreditavam que ele era. A situação escala e o livro narra a queda de Ambrosio, com todos os crimes e desvarios que a sua natureza humana, ao longo do tempo tão reprimida, o compele a cometer. Entrelaçada na história do monge estão as histórias de dois casais: Lorenzo e Antonia e Raymond e Agnes, cujas vidas vão ser influenciadas pelos crimes pérfidos do terrível monge.
Ora bem, para mim isto é gótico. Do princípio ao fim. É mesmo assustador. E ainda por cima, dentro do género, é intemporal, porque ainda assusta hoje como assustava naquela altura. E eu geralmente nem me assusto. Eu sou aquela menina que pode ver todos os filmes de terror e ninguém vai ouvir sequer um pio. Não me assusto com ficção. Mas esta obra é notável. É incrível mesmo. Tudo o que há de mais assustador está aqui: crimes como assassinato e violação, pessoas presas em masmorras debaixo da terra, demónios e pactos com o Diabo, situações de reféns, etc etc etc. Nas últimas páginas até Lúcifer aparece. É uma das obras do fantástico e sobrenatural mais completas que li. E, dentro do género do gótico (que tem sido o meu objeto de estudo no último ano, como vos tinha dito), é a melhor que li até à data.
Não posso falar desta obra (nem eu nem ninguém), sem referir o peso da religião e da opinião sobre a mesma na altura. Parece-me que existe aqui uma visão negativa relativamente à vida religiosa e à vida em reclusão monástica que não pode ser ignorada. A superstição e restrições associadas à mesma são encaradas como fonte de mal. E a negação da liberdade, e até da natureza humana, que estas implicam são vistas como a força que move o descontrolo dos impulsos e comportamentos de Ambrosio. A ignorância necessária à superstição e castidade também são vistas como um mal e, é devido a estas que muitas das desgraças têm lugar na obra. Parece-me que há na obra uma forte crítica relativa à religião, mas sobretudo à sociedade.
Há aqui outra coisa que tem de ser mencionada. O contexto em que a obra foi escrita e publicada. Se me chocou a mim, no século XXI, nem quero pensar no caos que causou nas mentes da altura, em 1796. Na verdade, muitas foram as vozes se fizeram ouvir. Alguns proclamavam o sucesso e mestria da obra, como Byron e Sade (que dois!), outros disseram que não era, por boa que fosse, aconselhável. Coleridge descreveu-a como “veneno para os jovens” e, Ann Radcliffe (que havia sido a inspiração de Lewis!), perturbada com a obra, até teve a necessidade de escrever O Italiano em resposta, como já vos tinha dito. A maioria das pessoas ficou chocada com o grafismo, a violência e a natureza explicíta da obra, que, em muitos casos, foi até censurada antes de apresentada para leitura. Contudo, os menos sensíveis e mais intelectuais foram unanimes em reconhecer a genialidade do livro. Lewis ficou famosíssimo! A partir daí foi sempre o "Monk" Lewis. Querido e desejado em todas as elites e grandes festas.
Ninguém tem noção do quão presa ao livro eu fiquei. É tão viciante. Não consegui largá-lo até o acabar e meter na estante! A história prende muito e eu estava sempre à espera de descobrir o que é que Ambrosio ia fazer a seguir. Como é que podia ficar ainda pior do que já estava? Acreditem numa coisa, até ao final, foi sempre ficando pior. É simplesmente genial. Nem consigo conceber que Lewis tinha apenas 20 anos quando a escreveu. Como é que se tem uma visão do mundo tão negra e, ao mesmo tempo tão fiel, aos 20 anos? Inacreditável.
Já sabem o que vos vou dizer, não é? Recomendo (muito) a leitura. A sério, leiam!
Idioma de leitura: Inglês
4,5/5