“Os Miseráveis”, Victor Hugo
“Basta amar ou ser amado. Não peçam mais nada depois. É esta a única pérola que podemos encontrar nos caminhos tenebrosos da vida. Amar é uma consumação.”
Após quase um mês de ausência, regressei. E voltei com uma justificação para este tempo afastada: Os Miseráveis. Vocês literalmente não têm noção de há quanto tempo eu queria ler este livro. A única razão pela qual não o li antes é simples e prende-se com o seu tamanho. Mas agora lá foi. Li a grande obra de Victor Hugo e não podia estar mais feliz e literariamente realizada do que estou neste momento.
Não vou pôr-me a contar-vos a história porque de certeza que vocês sabem. A grande história de Victor Hugo tem como protagonista Jean Valjean mas também a sociedade francesa do século XIX e expõe todos os defeitos e qualidades dos mesmos. Nada fica de fora.
Sabem que eu fiquei muito impressionada com este livro e tive o cuidado de pesquisar e perguntar: era mesmo assim? Era. Por muito que me faça confusão, era exatamente assim que se vivia. A miséria era real e era sentida por todos os miseráveis de Paris. O livro não é um hino a Paris e à sua sociedade, como já li por aí. É exatamente o oposto. É uma demonstração dos seus defeitos e podridão: um hino à sua inglória e à sua sociedade em decadência. E o mais grave, porque é que ninguém viu e tentou mudar o que estava a acontecer? Porque é que houve tantos miseráveis? Porque pagaram tantas pessoas por pecados que nem pecados podem ser considerados? Não sei. Digam-me vocês, porque a única coisa que eu sei com toda a certeza, é que este livro é das coisas mais perfeitas que já tive o prazer de ler
Mas não é tudo crítica social. A história de amor entre Cosette e Marius é linda, e eu, como romântica incurável que sou, venerei-a e identifiquei-me muito com ela, até pela sua castidade, inocência, e devoção, algo que já não se vê hoje em dia, nem a nível real nem fictício. Porém, a história de amor de Jean Valjean pela menina por quem se tornou responsável é ainda mais linda e pura, é desinteressada e incrivelmente bela, é veneração pura.
Enquanto lia este livro, houve diversos momentos em que ele me fez lembrar de uma outra obra gloriosa que já tive oportunidade de ler e sobre a qual escrevi aqui no blog, falo claro de Guerra e Paz de Lev Tolstoi. As obras são semelhantes em várias características: para começar, o tamanho, mas também os capítulos breves mas intensos e divididos em “livros”, a questão da revolta patente na sociedade, as descrições exaustivas, uma história de amor jovem e viciante mas muito casta, pura e intensa. E claro, a crítica social. Neste aspeto para mim há uma coisa que enaltece muito a obra de Hugo em relação à de Tolstoi: a crítica em Os Miseráveis é intensa, crua, fria e muito perspicaz. Em Guerra e Paz é mais leve, ainda que precisa, e a certo nível mais romanceada e desculpada. Mas não me cabe a mim comparar estes dois monstros da literatura e do cânone. A verdade é que nem me sinto à vontade para falar sobre estas obras, sinto-me envergonhada e embaraçada, e tenho receio de me estar a humilhar com a minha leitura das mesmas que certamente não é tão boa e precisa quanto elas merecem.
Só houve uma coisa que me impede de dizer que este livro merece a classificação máxima (na minha modesta e não especializada opinião): o facto de haver alguns capítulos dedicados exclusivamente a descrições que por vezes se tornam muito maçudas e quebram o ritmo de leitura. Como é óbvio isto também enriquece o livro e não lhe retira mérito em nada, muito pelo contrário.
Quando acabei a obra, disse à minha família ao jantar exatamente isto: “já acabei Os Miseráveis. Estou muito comovida”. Acho que isto resume tudo. Já fiquei emocionada com muitas obras, não vou mentir. Mas digo-vos honestamente, nunca o tinha ficado com uma crítica social e por uma questão de injustiça. Geralmente, esta menina básica que vos escreve, chora com histórias de amor e por amantes condenados e mortes por amor. Esta menina básica não chora por achar que a sociedade sobre a qual lê é corrupta, imoral, e injusta. Mas ao ler este livro, foi exatamente isso que aconteceu.
Jean Valjean foi o maior mártir literário que já passou pelas minhas mãos e olhos. Ele foi condenado à morte porque roubou um pão. Nem era para ele, era para a irmã e os filhos pequenos da mesma. Se isto não vos trás lágrimas aos olhos, não sei o que trará. Mas sei que neste momento só por ter escrito isto já tenho a visão nublada. Mas sabem o que mais me custa? A sociedade fê-lo pensar que ele estava errado, não só não o ajudou como o condenou ainda mais, marginalizou-o ao mais alto nível. Ele levou uma vida de expiação e absolvição, dedicou-se a fazer o bem, tornou-se numa alma superior a todos aqueles que o condenaram, ajudou até os mais implacáveis inimigos, perdoou os que o maltrataram, e porquê? Porque achava que tinha cometido um crime capital naquele dia em que a família tinha fome. Tudo porque roubou um pão.
Vou concluir dizendo que Os Miseráveis foi das obras mais gloriosas que já li. A nível de crítica social é definitivamente a mais genial e incrível. O meu único arrependimento é não ter lido esta coisa majestosa mais cedo. Sinto que já vou tarde. Este livro muda mentalidades e forma personalidades. Com 22 anos não sei se há mais em mim e nos meus ideais para mudar e melhorar, mas uma parte de mim pensa que sim. No fundo, o ser humano nunca para de crescer e de evoluir, pois não? Estamos em constante mudança, não estamos? Não vos posso recomendar este livro vezes o suficiente. Por favor, leiam. Leiam. Leiam. Leiam. E se já tiverem lido, leiam outra vez. Vamos mudar o mundo.
Idioma de leitura: Português
4,5/5