“Uma Mulher Sem Importância”, Oscar Wilde
Todas as mulheres são rebeldes, geralmente estão numa ampla revolta contra si mesmas.
Esta semana venho falar-vos de uma outra leitura de oportunidade nestes tempos que passam tão devagar. Lembro-me que há semanas vos falei de De Profundis, então tenho consciência que estou a repetir um autor, mas não resisti quando encontrei esta obra! Como vos contei naquela altura, gosto muito de Wilde.
Vos descrever Uma Mulher Sem Importância (1893) como uma sátira em quatro actos à alta sociedade inglesa de século XIX. Aborda temas como o casamento, o amor, as relações entre homens e mulheres, o impacto das escolhas dos pais na vida dos filhos, as preconceções associadas à mulher e ao seu comportamento e também acaba por aflorar através de Hester, uma americana, os preconceitos ingleses face aos americanos e puritanos. Destaco a história que subjaz à peça e que se relaciona com uma prévia ligação entre dois dos personagens principais — Lord Illingworth e Rachel Arbuthnot — cujo reencontro potencia o decurso da peça. Rachel e Illingworth havia tido, quando jovens, um caso amoroso do qual nasceu George, e que resultou numa rutura entre os dois, já que Illingworth não queria casar com Rachel. Os dois personagens voltam a encontrar-se porque George, sem saber que Illingworth era seu pai (e este sem saber que George era seu filho), está prestes a partir com ele e a tornar-se seu secretário pessoal.
Gostava de destacar, muito brevemente, três aspetos que me interessaram especialmente. O primeiro é, claro, a interação social. Achei extraordinária a representação dos maneirismos, das conversas frívolas, da hipocrisia e da polidez, do calculismo e até de uma certa ingenuidade. Estava a ler a peça e parecia que estava a ver um filme. Um filme que nem parecia um filme, porque tudo nesta peça sugere genuinidade. Mas, bem, sabemos que Wilde circulava neste tipo de sociedade e reconhecemos o seu modo assertivo de representar, portanto, na verdade, nem deveria ter ficado surpreendida.
O segundo aspeto que queria mencionar relaciona-se com o debate que a obra suscita em relação à possibilidade de, realmente, as escolhas dos pais influenciarem ou não a vidas dos seus filhos. Foi um dos aspetos que achei mais interessantes e creio que isso se deve ao modo singular como a questão foi abordada — raramente com ironia, ao contrário do que acontece com quase todos os outros temas. Reflexões neste âmbito surgem, por vezes, dotadas de um tom que comove e contrasta com aquele da restante obra. Já para não falar que todos reconhecemos a pertinência, recorrência e atualidade do tema. Novamente, não posso deixar de especular se esta escolha de tema e a diferença no modo como ele é abordado não surge da experiência pessoal do autor e dos seus próprios receios e conclusões.
Por fim, queria dar o maior destaque à fluência e concisão dos diálogos. Não exagero quando digo que cada fala parece o enunciar de uma máxima. E o extraordinário é que estas expostas de forma tão breve, simples e categórica que impressiona; pela capacidade de síntese e pela forma pessoal e próxima que facilita o entendimento. Neste campo, não posso deixar de destacar as intervenções de Lord Illingworth e de Mrs Allonby. Sobretudo no que concerne as relações românticas e sociais.
Em suma, creio que resulta evidente o quanto gostei da obra. Muito mesmo. E recomendo a leitura. A peça é muito breve, como vos disse, lê-se realmente muito bem e rapidamente. Também sei que está traduzida em português e, na verdade, a versão original encontra-se muito facilmente. Então, porque não? Antes de Uma Mulher Sem Importância e excetuando O Retrato de Dorian Gray, De Profundis e alguns poemas, de Wilde, apenas tinha lido a peça Um Marido Ideal. Lembro-me de na altura ter gostado bastante dela, mas não me parece que tanto como agora de Uma Mulher Sem Importância. Já leram? Quais são as vossas opiniões?